IMPACTO TERRITORIAL DA EXTRAÇÃO GLOBAL
Perda de biodiversidade e mudanças climáticas
Na região do Tapajós, a perda de biodiversidade está diretamente relacionada ao desmatamento e à degradação florestal, bem como à perda da sociobiodiversidade pelos povos indígenas e comunidades tradicionais que manejam os recursos naturais há séculos. As plantações de pasto e soja, a mineração de ouro e a expansão da infraestrutura associada às commodities agrominerais são os principais fatores de pressão associados ao desmatamento. O fogo e a extração seletiva de madeira são normalmente o primeiro estágio do desmatamento e representam os principais fatores que causam a degradação florestal na região do Tapajós.
Historicamente, os estados do Pará e do Mato Grosso têm liderado alternadamente as taxas de desmatamento na Amazônia Legal brasileira desde 1988. A Amazônia Legal é uma região administrativa de planejamento no Brasil que abrange estados e municípios dos biomas Cerrado e Amazônia, especialmente em suas zonas de transição, onde a expansão das fronteiras de commodities persiste e tem aumentado significativamente desde meados da década de 1990. O Brasil, e especialmente a Amazônia Legal, foi marcado por uma queda significativa no desmatamento entre os anos de 2003 e 2012, quando o desmatamento caiu de cerca de 25.000 km² para pouco mais de 4.000 km². No entanto, no governo Bolsonaro, os índices de desmatamento voltaram a subir. Entre 2012, quando o desmatamento atingiu a menor taxa desde 2000, e 2022, o desmatamento na Amazônia Legal aumentou 153%.

Tipos de desmatamento acumulados para o período 2016-2020 na região do Tapajós, Brasil.

Desmatamento consolidado e recente por período (2008-2018 e 2019-2021) na região do Tapajós, Brasil.
O Estado do Pará tem buscado se colocar como protagonista nas ações de redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE), especialmente ligadas ao desmatamento na Amazônia brasileira. Em 2020, o estado promulgou o Plano Amazônia Agora, que tem como objetivo alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU); implementar os instrumentos para alcançar o mecanismo de “Redução de Emissões por Desmatamento, Degradação Florestal (REDD+); implementar as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs); e incentivar atividades que promovam a prevenção e a mitigação das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). Como parte dessa estratégia, o estado está desenvolvendo o Projeto Descarboniza Pará, que busca alcançar a neutralidade climática na área de “uso da terra e florestas” antes de 2036, e é financiado pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Outra iniciativa é o Plano Estadual de Bioeconomia (PlanBio), lançado em 2022, cujos objetivos incluem a redução das emissões de GEE e a promoção de cadeias de valor da sociobiodiversidade no Pará.
Paradoxalmente, o Pará ocupa o ranking dos estados amazônicos com as maiores taxas de desmatamento desde 2006 e ficou em primeiro lugar em emissões de GEE no Brasil em 2021. Desde 2017, as emissões no estado aumentaram em 70%. Em 2021, 85% das emissões estavam associadas a mudanças no uso da terra e florestas, enquanto no Brasil esse índice foi de 49% (SEEG, 2023).
Há várias críticas aos planos e políticas que visam à adaptação e à mitigação das mudanças climáticas no estado. As críticas incluem a falta de participação efetiva de povos indígenas e comunidades tradicionais, a centralização da tomada de decisões em instituições públicas, a ausência de metas claras para a redução de emissões e de sanções em caso de descumprimento das medidas propostas pelos setores envolvidos.
Na região do Tapajós, o cenário dos investimentos e das políticas voltadas para a produção/extração de commodities agrominerais e infraestrutura para transporte está na contramão das políticas climáticas e de biodiversidade anunciadas pelo Estado. Novos projetos de infraestrutura, como a hidrovia do Tapajós, a ferrovia Ferrogrão, os novos terminais portuários em Itaituba e no Lago Maicá, representam a consolidação da região como um polo de exportação de commodities, o que, por sua vez, incentiva a conversão de florestas em áreas de produção e extração, afetando diretamente as emissões e a biodiversidade.
Justiça ambiental
A continuidade e o processo de expansão da produção de ouro, soja e gado e a implantação da infraestrutura necessária para seu armazenamento, transporte e exportação estão causando violação dos direitos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais da região do Tapajós. O Porto da Cargill, por exemplo, foi instalado em Santarém sem a devida avaliação de impacto ambiental, conforme exigido por lei. O porto fica sobre o principal ponto de lazer de Santarém. Em Itaituba, os terminais portuários de Miritituba estão sob um sítio arqueológico Munduruku, cujas peças não foram removidas nem realocadas e as reivindicações do povo Munduruku nunca foram ouvidas. O terminal portuário planejado pela EMBRAPS no Lago Maicá, em Santarém, causará grandes alterações na dinâmica socioecológica local, afetando a atividade pesqueira de subsistência e a geração de renda de aproximadamente 1.500 famílias ribeirinhas e quilombolas que vivem às margens do lago. Além disso, o Maicá abriga o mais antigo sítio arqueológico conhecido em Santarém, com 8.000 anos de idade, além de muitos outros sítios recentes (entre 500 e 2.000 anos) ainda não mapeados. Da mesma forma que no caso da Cargill, a instalação do porto da EMBRAPS no Maicá viola a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), pois não cumpre as determinações dos protocolos de consulta às comunidades, nem respeita suas decisões.
Outros tipos de violações incluem a expulsão de pequenos agricultores assentados pela Reforma Agrária de suas terras e o aliciamento de fazendeiros, geralmente vindos do sul e do centro-oeste do Brasil, estimulados pela oferta de terras baratas adequadas para a produção de soja e gado. A chegada de fazendeiros aos assentamentos de reforma agrária resulta em ameaças de morte aos líderes que se opõem ao arrendamento ou à venda de lotes rurais. Há situações em que essas lideranças são enquadradas no Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos, desenvolvido em parceria com o Governo Federal. No Pará, há 53 pessoas ligadas aos Direitos Humanos que estão nesse Programa e muitas delas estão no programa devido a conflitos agrários. Esse tipo de disputa pela terra também ocorre em territórios indígenas e quilombolas. A prática de grilagem de terras nessa região tem causado, além de ameaças de morte, assassinatos.
De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, em 2022, foram registradas 22 ameaças de morte devido a conflitos rurais no Pará, sendo 7 delas na região do Tapajós. Em todo o estado, foram registrados 175 conflitos rurais em 2022, envolvendo mais de 3.000 famílias.